terça-feira, 14 de janeiro de 2014

Ralé

Ralé acorda na Macedônia, toma café na Caledônia e vem sorrir no Brasil, anda com uma meia de cada cor, um terno furado e a barba por fazer.

Tropeça nas calçadas, toma água pensando ser limonada e conversa com o cachorro imaginário antes de partir.

Sai de casa cantando, ao contrário, para ver se tem sentido. Conta listras das calçadas, observa as nuvens. Para e tenta sentir se consegue perceber o mundo girar.

Ralé, não tem carro, não tem casa, não tem mulher, vive de sonhos e de tudo o que quer.

Esquece o passado, ignora o futuro e vive o presente, vende idéias, contrabandeia o tempo e é acusado de homicídio contra a realidade.

A realidade foi morta por ele, qualquer dia destes, em que buscava algo que perdeu numa rua qualquer, de um tempo perdido, num dia esquisito, que não lembra qual é.

Ralé, não tem noção do tempo, não é entendido no emprego, nem por ninguém.

Vive preso na própria realidade, da fantasia que criou. Onde já é tão impossível, que se torna possível quando se quer acreditar...

Trata-se de uma realidade inventada, em meio a história nunca contada, que ninguém acredita.

Todos aqueles que vivem a dura realidade de um mundo sem sonhos odeiam Ralé, chamam ele de louco, de um ser sem pretensão, todos tem pena do pobre coitado, que vive ensimesmado, embasbacado, talvez até abobado...

Como pode tamanha infantilidade, solidão sofrida, sem demonstrar a dor.

Só porque Ralé tem o coração guardado, preso com cadeado, por medo de sofrer?

Porque se a realidade for a única opção de liberdade, talvez a prisão das idéias, seja um meio sincero de viver a imaginação.

Pois ao compartilhar com o mundo um pouco do que sente, Ralé percebe, que não nasceu para aqui não.

Ralé é um viajante de outro mundo, não deste canto imundo, em que odeiam a ilusão.

Pobres coitados dos inocentes que pensam que a realidade é a opção racional, talvez o mundo um dia perceba que nada tem graça sem imaginação.

E que a realidade é uma faca afiada, que se enfia na carne e ataca o coração, destruindo qualquer cadeado, mesmo que bem fechado, atacando a ilusão.

O mundo não foi feito pros loucos, por isso não são poucos os que vivem em vão.